O Convento de Monchique: Um Património Eternizado por Camilo Castelo Branco

No coração do Porto, um lugar histórico e misterioso permanece como testemunha silenciosa de séculos de transformação e esquecimento: o Convento de Monchique. Imortalizado no célebre romance “Amor de Perdição” de Camilo Castelo Branco, este antigo convento tem uma história fascinante que remonta ao século XVI.

A história do convento começa com a generosidade de Pêro Coutinho, um nobre sem descendência que doou sua propriedade à Casa de Monchique, com o objetivo de erguer um convento dedicado a S. Francisco. A autorização papal foi concedida em 1535, e assim começou a transformação do antigo paço de Pêro Coutinho numa casa conventual, sob a orientação do mestre-de-obras Diogo de Castilho, cujo renome já se destacava no Mosteiro dos Jerónimos e na Igreja de Santa Cruz.

O Convento de Monchique cresceu ao longo dos séculos, expandindo-se entre o cimo da colina até à margem do rio Douro, com uma entrada monumental que ainda hoje evoca a grandiosidade de outrora. Durante os séculos XVII e XVIII, o convento foi ampliado e embelezado, adornado com claustros ajardinados e chafarizes, tornando-se um dos locais mais belos e ricos do Porto.

No entanto, o século XIX trouxe mudanças drásticas. O convento foi desativado e dividido em lotes, sendo vendido em hasta pública. Uma parte acabou nas mãos de uma família inglesa, enquanto outra se tornou propriedade do negociante Clemente Meneres, que transformou parte do edifício em armazém de vinhos e fábrica de rolhas. Apesar das alterações e do abandono, o corpo principal do edifício permaneceu de pé, testemunhando a sua grandeza passada.

De salientar que no local do convento, já antes D. Fernando Don Yahuda Ibn Maner, funda a terceira sinagoga do Porto, em 1380. E desta sinagoga existe um documento que é uma inscrição de inauguração, a maior conhecida dos judeus em Portugal e que foi encontrada em 1826, agora no Museu Arqueológico do Carmo de Lisboa.

É triste contemplar o estado atual do Convento de Monchique, uma vez considerado um dos mais belos da cidade. A sua arquitetura única e a sua conexão com “Amor de Perdição” de Camilo Castelo Branco deveriam ser motivo de preservação e orgulho. No entanto, parte do convento foi recentemente recuperada como parte do Hotel Neya, um projeto que busca integrar o património histórico pré-existente ao dinamismo contemporâneo da cidade.

A transformação do Convento de Monchique em Hotel Neya representa um esforço para recuperar e preservar a nossa história, mantendo viva a memória deste local extraordinário que desempenhou um papel tão importante na literatura e na história do Porto. É um lembrete de que o passado não deve ser esquecido, mas sim valorizado e incorporado ao presente, para que as gerações futuras possam apreciar e aprender com a nossa rica herança cultural.

E assim, eu e a Doutora Ligia fomos ver de perto o que foi preservado, e que fica na parte de dentro do Hotel Neya. Aproveitamos também para um fim de tarde no terraço do Hotel com uma maravilhosa vista sobre o Douro.

Fica aqui o registo fotográfico.

Este é o legado do Convento de Monchique: uma narrativa de beleza, generosidade e transformação, enraizada nas páginas da literatura e na alma do Porto. Que o seu valor perdure e seja celebrado, para que nunca mais seja esquecido.

“– Onde é Monchique? – perguntou Simão a Mariana.
– É acolá, senhor Simão – respondeu, indicando-lhe o mosteiro, que se debruça sobre as margens do Douro, em Miragaia.

Cruzou os braços Simão, e viu através do gradeamento do mirante um vulto.
Era Teresa.
Na véspera recebera ela o adeus de Simão, e respondera enviando-lhe a trança dos seus cabelos.”

(In Amor de perdição)

Deixe um comentário